O Estado da Arte – XIV


O Encanto Mágico e o Muito ou Pouco
por Rui Serra e Moura

O que é então isso do “encanto mágico”? É uma expressão utilizada pelo meu avô nuns escritos meio autobiográficos que ele nos deixou, e eu não esqueci. Dizia ele que quando em miúdo ia ver “a banda passar” (final do séc. XIX), experimentava então como que um “encanto mágico” com o ribombar das tubas e dos trombones, o serpentear dos clarinetes, o trovejar dos bombos e o explodir dos pratos. Este encanto moldar-lhe-ia toda a sua vida e, quiçá, até a minha. A diferença entre esta atitude, e a gratuitidade com que os jovens hoje experimentam a música, é que importa. Recordo-me imediatamente de uma conversa com um aluno mau, - perdão -, um aluno meu, que me dizia ouvir muita música. Perguntei-lhe se ele a escutava, e ele disse que sim, mas claramente sem perceber muito bem o que eu queria dizer. Expliquei então que eu pelo contrário, - para ele surpreendentemente -, não ouvia muita música, justamente porque a gostava de escutar, e que quando queria ouvir um ou dois pares de álbuns, tinha que disponibilizar-me o tempo suficiente para o fazer em completa comunhão e imersão nas obras, e não concomitantemente com qualquer outra coisa, como percebi depois que esse meu aluno fazia, ou a estudar, ou ao computador a trabalhar ou a navegar, ou até a correr. Lembro-me de lhe confessar que eu não conseguia trabalhar no que quer que fosse a ouvir música, porque inevitavelmente a minha atenção se focava na música, independentemente do seu estilo ou autor, do meu agrado ou desagrado, e não no que estivesse a fazer. Conclusão? Daqui a uma quinzena. Até lá.


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